Ratings4
Average rating4.5
We don't have a description for this book yet. You can help out the author by adding a description.
Reviews with the most likes.
Joaquim Soeiro Pereira Gomes nasceu em Gestaçô, distrito do Porto, no ano de 1909. Foi um dos grandes nomes do neo-realismo em Portugal.
Trabalhou como empregado administrativo numa fábrica de cimentos – Cimentos do Tejo, actual CIMPOR - e começou a desenvolver um trabalho de dinamização cultural junto da classe operária.
Militou no Partido Comunista Português e hoje a sede do partido recebe o seu nome (Edifício Soeiro Pereira Gomes).
Entre as suas obras, destaca-se “Esteiros”, publicado em 1941, que é considerado a sua obra-prima. A primeira edição do livro foi ilustrada por Álvaro Cunhal, secretário-geral do PCP.
Mesmo vivendo clandestinamente durante o governo de Salazar, Soeiro Pereira Gomes continuou o seu trabalho como militante até adoecer com cancro no pulmão. Impedido de receber o tratamento médico necessário, faleceu em cinco de dezembro de 1959.
Fábrica Cimentos do Tejo, Alhandra
Esteiros. Minúsculos canais, como dedos de mão espalmada, abertos na margem do Tejo. Dedos das mãos avaras dos telhais, que roubam nateiro às águas e vigores à malta. Mãos de lama, que só o rio afaga.
Outono
Com os prenúncios de Outono, as primeiras chuvas encheram de frémitos o lodaçal negro dos esteiros, e o vento agreste abriu buracos nos trapos dos garotos, num arrepio de águas e de corpos.
Inverno
Mãos esquecidas nos bolsos e pés roxos de frio, os garotos cosiam-se com os portais, à espera do caldo ou do sol que pouco aquecia.
Primavera
Flocos de nuvens no céu, como o bando de pombas brancas que roça asas no Mirante. Nuvem de flores nas árvores do vale. Céu a desbotar azul no rio calmo, sem remorsos das cheias, de que já pouca gente se lembra.
Verão
Os saveiros apagam as luzes. Depois — remos em movimento, como asas enormes de pássaros — vêm encostar-se à ponta dos esteiros, enquanto a água vaza. São mais negros do que a noite — negros como a vida de quem neles labuta, noite e dia.
Gineto
Com sete anos, ia o pai levá-lo pelas orelhas até à eira.
— Mestre: tome-me conta deste fidalgo.
Mas antes de o pai chegar ao portão, atravessava ele o caniço dos esteiros e, mesmo vestido, atirava-se ao rio. A corrente era forte, mas na outra margem havia pássaros, toiros bravos a pastar e valados desconhecidos. À noite, esperava-o a tareia do costume, em vez da ceia, e, na manhã seguinte, regressava ao telhal pelas orelhas.
Sagui
Sagui era pequeno, mas tinha fama de comilão. Só fama...
Maquineta
— Quando eu trabalhar com as máquinas... — E, de tanto falar em máquinas, chamaram-lhe Maquineta.
Gaitinhas
João era o Gaitinhas, porque gostava de imitar os instrumentos da banda musical. Nos domingos de concerto, postava-se junto do coreto, atrás do regente, de olhos postos nos saxofones e clarinetes reluzentes, indeciso na escolha.(...) Mas entrou para a escola e quis ser doutor.
Para os filhos dos homensque nunca foram meninos,escrevi este livro.