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Graça Pina de Morais, outra grande descoberta em 2022!Há uma certa proximidade na escrita de GPM e [a:Maria Judite de Carvalho 1188758 Maria Judite de Carvalho https://images.gr-assets.com/authors/1389893916p2/1188758.jpg], talvez porque ambas viveram numa sociedade maioritariamente masculina e atrasada.Foram um segredo bem guardado, mas que felizmente foi descoberto.A escrita de GPM é crua e acutilante, tem uma atenção ao detalhe e às coisas mais simples do quotidiano. Os Semideuses Gostava às vezes de entrar nas igrejas, não pelos santos - mas pelos olhos que lá tinham estado fanaticamente pregados, e pelo sofrimento total, à procura do último recurso que ali ficava concentrado, no incenso e no bafio, entre as paredes escuras.Jogos de Água(...) quando um homem se dispõe a fazer versos, só essa simples intenção já vale muito.É como que uma adolescência mantida, uma força que ainda não morreu. (...) Os estados de alma podem-se descrever mais ou menos artisticamente, mas só são descobertos por aqueles que viveram a mesma coisa, que já desvendaram o mesmo por experiência própria. Eu exemplifico: só perto dos trinta anos, torturado entre a angústia de viver e o conhecimento de que tudo poderia terminar no aniquilamento, enfim, na morte, compreendi o que queria dizer o “ser ou não ser” do Hamlet.Cristina- Eu continuo a gostar de ti!- Quando o descobriste? – perguntou apenas.- Uma noite destas, sonhei contigo. Mas o meu amor por ti é tão desesperado, tão grande, tão triste! E esta separação a que a lei do mundo sujeita dois seres era insustentável em relação a ti. - Talvez seja uma mania - murmurou Cristina - mas não adianta nada porque o amor é precisamente uma mania. As pessoas iluminam-se e apagam-se à nossa volta, sem sabermos porquê. Os IncomunicáveisAntes de se deitar, parou em frente do espelho do guarda-vestidos e ficou a olhar-se com estranheza. Há alguns meses que se sentia desligado da sua própria imagem como se esta realmente não lhe pertencesse. Essa impressão causava-lhe um sentimento angustioso, tão acabrunhante que pensava no suicídio cada vez com mais frequência. Na sua fisionomia sentia-se, mais do que se via, a proximidade da devastação. A sua cara era talvez a de todos os dias; mas as pálpebras fatigadas caíam sobre o olhar mole e doente dum desconhecido. Os cabelos tornavam-se cada vez mais raros nas fontes e a sua face cavada adquiria um desenho longuilíneo, exangue e triste. Na sua infância havia um rosto que sempre lhe despertara uma inconfessável repugnância. Era uma aversão de ordem estética, tanto mais que estimava sinceramente o seu possuidor. Agora via no espelho o rosto longo, frio e tumular do seu avô. Quantas vezes se retraíra ao ser beijado por ele! Seria que o destino se encarregava de punir o pecado infantil? Aproximou-se do leito e sentou-se pesadamente. Não... Estava demasiado cansado para poder pensar em despir-se. A sua irmã Inês ainda não recolhera ao quarto. Ao entrar, vira a luz do living acesa e esgueirara-se pela escada acima, pensando que a mais familiar das conversas seria exaustiva.