Ratings4
Average rating4
Num sanatório na Suíça, reúnem-se indivíduos de várias raças e credos. Aí se entrelaçam problemas, inquietações, sofrimentos de toda ordem. Construído nos anos seguintes à Primeira Guerra Mundial, este romance busca mostrar um painel de uma Europa enferma, à procura de uma unidade.
Reviews with the most likes.
Thomas Mann - Prémio Nobel da Literatura, 1929
“principalmente por seu grande romance, Buddenbrooks, que ganhou reconhecimento cada vez maior como uma das obras clássicas da literatura contemporânea”
Thomas Mann, filho de pai alemão e mãe brasileira, nasceu na cidade livre de Lübeck, hoje pertencente aos estados alemães de Schleswig-Holstein e Mecklemburgo - Pomerânia Ocidental.
A inspiração para escrever A Montanha Mágica veio do internamento da sua esposa Katia Mann, em Waldsanatorium, para curar um pretenso episódio de tuberculose. Ao visitá-la Mann decidiu instalar-se numa pousada e usar o conhecimento adquirido no dia-a-dia, no sanatório, para escrever esta obra-prima.
O livro narra a viagem de Hans Castorp ao sanatório Berghof, localizado em Davos-Platz , cantão de Graubünden - Suíça, onde deseja passar três semanas com o primo Joachim, um dos doentes ali internados. É uma história aparentemente simples mas que é imediatamente contrariada na primeira página, onde o narrador aborda de forma excepcional o grande tema do romance: O Tempo.
No sanatório Berghof, os pacientes, pertencentes a uma elite europeia, observam superiormente a restante humanidade, confinados num espaço em que o tempo é medido de forma diferente e deixou de ter o significado do tempo na planície.
“(...) o tempo das pessoas não interessa aqui para nada. Vais ver, para eles, três semanas são como um dia. Ainda irás aprender tudo isto (...) – pág. 17
A monotonia das descrições minuciosas (realismo) juntamente com o quotidiano dos pacientes é quebrada com o surgimento de algumas personagens que são inesquecíveis.
Settembrini – humanista, liberal italiano. Disserta sobre democracia, direitos humanos, liberdade individual, a busca pelo conhecimento, pela arte e a importância da literatura para a humanidade. Um personagem recheado de simbolismo. O italiano é o primeiro passo na iluminação do jovem Hans como cidadão do mundo.
“- Eis-nos chegados ao que interessa, meus senhores! – exclamou Settembrini. – Eis-nos chegados!E começou a falar do “verbo”, do culto da palavra, da eloquência, que classificava como triunfo do humano. A palavra era, a seu ver, a honra do homem e só ela tornava a vida digna e humana. Não era o mero humanismo que ele via como indissociável do verbo e da literatura, mas todo o humanitarismo, toda a dignidade da condição humana, o respeito pelos outros homens e de cada homem por si mesmo.” – pág. 183/184
Naphta – Um radical, jesuíta judeu, opositor da democracia, defensor da Inquisição e dos aspectos mais implacáveis do catolicismo.
“- Não! – continuou Naphta. – O segredo e o mandamento dos nossos tempos não consistem na libertação e no desenvolvimento do Eu. O que a nossa época necessita e reclama, e o que acabará por gerar, chama-se...terror.” – pág. 450
“- Quanto à dignidade e à desonra – retorquiu Naphta – muito haveria a dizer. Para já, ficaria imensamente satisfeito se as minhas palavras lhe dessem ensejo de conceber a liberdade mais na qualidade de problema do que de belo gesto. O senhor fez notar que a moral económica de pendor cristão, não obstante toda a beleza e humanidade de que se reveste, gera servidão. Eu, por minha parte, constato que a causa da liberdade – ou das cidades, numa formulação mais concreta - , independentemente do carácter ético que possa ostentar é, do ponto de vista histórico, indissociável da degeneração mais desumana da moral económica, de todos os horrores resultantes do comércio e da especulação da modernidade, do poderio satânico do dinheiro e do negócio.” – pág. 455
Os embates entre estas duas personagens são memoráveis e o seu fim é extremamente simbólico e, previsivelmente, trágico.
Peeperkorn – holandês, plantador de café, rico. Ao lado da dupla Settembrini e Naphta é apenas um ignorante que não se impõe pelas ideias mas pela sua envergadura e força.
Clawdia Chauchat – A sedutora oriental. Representa a passividade, irracionalidade, negligência e a submissão. Não gosta nem de Settembrini nem de Naphta, goza com Joachim e ama Peeperkorn. Hans Castorp apaixona-se por ela à primeira vista.
Pribislav Hippe - Colega de escola de Hans e por quem ele se sentia fortemente atraído.
Logo nas primeiras frases do propósito Thomas Mann caracteriza Hans Castorp como “um jovem simples, se bem que simpático”, mas à medida que a história avança percebemos como Hans não é uma mente simples e que um dos temas do romance é o longo, penoso e perigoso caminho da auto-educação de Castorp.
A complexidade e o mistério do tempo são outro tema recorrente ao longo de todo o romance. Na minha humilde opinião, o tempo é o protagonista desta história.
Há duas passagens que me maravilharam:
Quarto CapítuloSub-capítulo - “Excurso sobre o sentido do tempo”
“- Não posso deixar de achar estranha a sensação de o tempo passar muito lentamente quando chegamos a lugar novo. Quer dizer...É evidente que isso não significa que me esteja a aborrecer, bem pelo contrário, posso afirmar que me estou a divertir à brava. Contudo, quando olho para trás – retrospectivamente, portanto -, vê lá se me entendes, tenho a impressão de já cá estar há imenso tempo.” - Pág. 124
Sexto CapítuloSub-capítulo – “Mudanças”
O QUE É O TEMPO? UM MISTÉRIO – IRREAL E TODO-PODEROSO. É CONDIÇÃO DO mundo sensível, é movimento associado e mesclado com a existência dos corpos no espaço e com a sua dinâmica. Mas deixaria de haver tempo, se o movimento desaparecesse? Deixaria de haver movimento, se o tempo se dissipasse? Perguntas inglórias! Será o tempo uma função do espaço? Ou vice-versa? Ou serão ambos idênticos? Tudo questões sem resposta! O tempo é dinâmico, tem uma natureza verbal, o tempo «produz». O que produz ele? A mudança! O Agora não é o Antes, o Aqui não é o Ali, porque entre eles se interpõe o movimento. Mas como o movimento – bitola pela qual se mede o tempo – é circular e fechado sobre si mesmo, pode ser visto como movimento e mudança ao mesmo tempo, uma mudança que também se poderia designar por imobilidade ou estatismo, já que o Antes se repete sem cessar no Agora e o Ali no Aqui.” - Pág. 388
Foram quatro longos meses de subida mas agora que aqui cheguei, ao topo da Montanha Mágica, não tenho vontade nenhuma de regressar à planície.